domingo, 28 de junho de 2009

VOO 1065 INSENSIBILIZAÇÃO OU EMBRUTECIMENTO?



Américo Silva
Esp.MARME Guiné
Angola
Caros Amigos
Riquíssima matéria para estudo de psicólogos, é certamente o comportamento humano durante o seu envolvimento em guerras e outros fenómenos idênticos. Tenho a consciência que todos quanto cumpriram serviço militar nas ex-províncias ultramarinas, uns mais do que outros, sentiram na “pele” os efeitos directos da guerra em que nos vimos envolvidos, ao longo de mais do que uma década.
Isto vem a propósito do conteúdo do texto da mensagem do nosso amigo Miguel Pessoa (voo nº 1062), no que respeita à insensibilização ou embrutecimento dos nossos comportamentos.
Recordo-me perfeitamente, de quando cheguei à Guiné em Junho de 1970 e comecei a ter contacto visual no dia-a-dia com as chegadas de feridos à “placa”, muitos dos quais com ferimentos terríveis, enfim, imagens que me impressionavam muito, ao ponto de me impelirem a afastar para não as ver, pois isso mexia bastante com a minha estrutura psicológica e o meu carácter.Com o decorrer do tempo e pela participação mais directa e activa no conflito, vi completamente alterado o meu estado de espírito e comportamento, a “tal” insensibilização ou embrutecimento, face aos acontecimentos diariamente vividos, ao ponto de me recordar em presenciar a chegada de alguns feridos em Do-27, transferidos de imediato para Al.III, que os transportaram para o Hospital Militar em Bissau, com todo aquele aparato e isso não me tirar o apetite nem interromper a comida de uma sandes de queijo, acompanhada de coca-cola gelada, adquirida ali no bar improvisado do hangar dos Fiats, como se recordarão.Com o passar do tempo e já depois de ter regressado à “Metrópole”, senti-me recuperado de todos esses efeitos nefastos, sem sonhos nem pesadelos, podendo hoje afirmar que tudo não passou de um capítulo importante do livro das nossas vidas, que pessoalmente recordo com um misto de nostalgia e felicidade pelo dever cumprido.
Américo Silva
Angola
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