quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Voo 2525 A MINHA NAMORADA (1ª Parte)







Victor Sotero
SargºMor EABT
Lisboa




Saúdo o “Comando”, a “Linha da Frente” e todos os “Zés” que por aqui nos vão espreitando.
Um dia destes, subia a Calçada da Estrela.
Os sinos da Basílica tocavam.
Em frente, apenas um táxi no seu local de trabalho entre o Jardim da Estrela e a Basílica.
Para me deliciar a ouvir os sinos, estaciono.
Há sempre movimento de pessoas entre o Jardim da Estrela e a Basílica que também é muito procurada por visitantes.
O táxi da frente saiu e eu fico em espera.
Não cheguei a ouvir o recital de sinos até ao fim.
Uma senhora bateu-me no vidro de trás e perguntou-me:
-Posso entrar?
-Faça favor, minha senhora. Boas tardes.
-Boas tardes, queria que me levasse à Boa-Hora, por favor.
-Concerteza, minha senhora.
Motor em marcha, Avenida Infante Santo para entrar no Calvário e subir a Calçada da Tapada. Mais à frente, a Rua da Aliança Operária, Rio Seco.
Na minha frente um eléctrico que ultrapasso com facilidade e começo a subir.
Calçada da Boa-Hora. Quase por instinto olho para o passeio da direita e lembrei-me daquele dia em que eu subia aquela rua para me dirigir ao Hospital da Boa-Hora apanhar as vacinas obrigatórias que me davam como “pronto” para o embarque.
Durante o resto da tarde esta lembrança foi minha “companheira”.
À noite procurei a minha velhinha agenda e lá estava:
-Dia 8 de Janeiro de 1968. “Engatei uma miúda que se chama São”.
Duas raparigas estudantes. Com as suas batas brancas e os livros dentro de uma capa de coiro, regressavam a casa para almoçar. Da parte da tarde teriam mais aulas.
Riam e brincavam quando me apercebi que a “festa” tinha origem em mim.
Meti conversa e lá fomos andando. As vacinas que esperassem!
A São, com seus cabelos compridos e alourados era mais atraente.
A certa altura, disse-lhe que ia para Angola e sem saber bem o significado, perguntei-lhe: Queres ser minha “Madrinha de Guerra”?Não sei se também sabia o que era ser “Madrinha de Guerra”, acho que não sabia.
Passados dois dias ou seja, no dia 10 de Janeiro de 1968, uma quarta-feira, eu estava a jantar com os pais e dois irmãos, (um já falecido) bife com batatas fritas.
O pai tinha um lugar de frutas e hortaliças na Rua do Cruzeiro. Viviam bem perto.
Eu tinha faltado a um embarque de DC-6. De “Madrinha de Guerra”, em pouco tempo, passamos ao “namoro”.
Apertava-se o “cêrco” e eu tinha mesmo que embarcar.
Tive ainda tempo para celebrar por cá os meus 19 anos. (24 de Janeiro)
No dia 27 de Janeiro eu teria que embarcar para Angola no navio “UIGE”.
A São era minha “namorada”. Ia ficar durante algum tempo sem notícias minhas mas logo que chegasse a Luanda haveria de lhe escrever.
 ...e despedi-mo-nos não só com um abraço mas sim com beijos e muito amor. Era a minha namorada.
Até um dia destes, meu Comandante.
Despeço-me com um até breve do “Comando”, da “Linha da Frente” e de todos os nossos “Zés”.
V. Sotero


 Na digitalização:


 Uma cigarreira oferecida pela São, minha "namorada"
https://mail.google.com/mail/u/0/images/cleardot.gif

1 comentário:

  1. Muito bonito o primeiro amor antes de ir para a guerra ,alguém que ficaria esperando a volta uma razão para viver feliz no meio de tanta coisa má.

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